No início do mês de julho foi publicado Acórdão nos autos do Recurso Extraordinário 634.764/RJ, através do qual o Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria de votos, declarar constitucional a incidência do Imposto Sobre Serviços (ISS) na distribuição e venda de produtos de loteria, bingos, cupons de apostas, sorteios, entre outros, inclusive para as apostas turfísticas, como é o caso do processo analisado.
Trata-se, na origem, de Mandado de Segurança impetrado pelo Jockey Club Brasileiro objetivando afastar o ISS sobre a venda de ingressos e os valores retidos em cada aposta realizada.
Com o desprovimento do recurso de Apelação interposto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o Jockey interpôs Recurso Extraordinário, fundamentando a existência de repercussão geral e, no mérito, alegando ofensa aos dispositivos Constitucionais que tratam da competência para instituir e cobrar tributos.
O STF reconheceu a repercussão geral da matéria, o que faz com que a decisão seja aplicada não apenas às partes, mas também a outras sociedades que tenham suas atividades voltadas às apostas, inclusive às casas de apostas que forneçam serviços online.
Ao analisar o recurso, os ministros levaram em consideração o panorama histórico de jurisprudências do STF e o conceito de “serviço” estipulado na Constituição Federal e nas jurisprudências da Corte, para então, tratar da validade da cobrança do ISS sobre a exploração da atividade de apostas e, por fim, chegar à base de cálculo do tributo.
De início, o Ministro Gilmar Mendes, relator do caso narrado, passou a definir a natureza jurídica da atividade das apostas em geral, como sendo “uma atividade humana prestada com finalidade econômica”, exigindo um esforço humano em favor de um terceiro, portanto, possuindo a natureza de um serviço.
O Acórdão não foi unânime, uma vez que o relator e o Ministro Alexandre de Moraes votaram pela constitucionalidade da incidência do ISS sobre a atividade de exploração de jogos e apostas, ao passo que o Ministro Marco Aurélio entendeu ser incompatível com a redação da Constituição Federal a incidência do imposto.
Para os votos vencedores, a disponibilização e venda de bilhetes, produtos de loteria, bingos, cartões, pules e cupons de apostas, nos termos do item 19 da Lei Complementar nº 116/2003, enquadram-se no conceito de serviço por se tratarem de atividade humana prestada com finalidade econômica e colocado em favor de terceiros.
Quanto à base de cálculo do imposto, os Ministros ponderaram se o ISS deveria incidir sobre o valor integral da aposta, sobre o valor dos bilhetes ou ingressos, ou sobre outra base tributável.
O Ministro Gilmar Mendes segregou os resultados obtidos em duas vertentes: (a) a parcela das apostas que retorna aos apostadores na forma de prêmios; (b) a parcela das apostas retidas pelos prestadores de serviços para remunerar suas atividades.
Foi decidido, então, que o ISS deve incidir sobre a parcela paga pela prestação dos serviços, entendido como o percentual do valor da aposta retido pela entidade/casa de apostas prestadora dos serviços, no caso, o Jockey Club.
As retenções são definidas por lei. Para as apostas do turfe, por exemplo, o artigo 23, §2º, do Decreto nº 96.993/1988, dispõe que os prestadores podem reter de 32% a 38% do valor total das apostas, devendo o restante retornar aos apostadores. No caso de apostas esportivas online, denominadas como “apostas de quota fixa”, o artigo 30, inciso II, alínea “f”, da Lei 13.756/18, destina ao prestador 8% da arrecadação total das apostas.
Por outro lado, o voto divergente do Ministro Marco Aurélio pontua que a venda de apostas não seria um serviço, mas sim uma obrigação de dar, eis que não envolve diretamente a atividade humana. O Ministro pontua, ainda, que seria descabida a cobrança do ISS uma vez que o Imposto de Renda incide sobre a mesma base de cálculo apontada pelo relator, qual seja, o produto da arrecadação, ensejando em uma usurpação de competência, tendo em vista que compete à União tributar o imposto sobre a renda.
No entanto, o Ministro Marco Aurélio foi voto vencido, fato em que resultou na constitucionalidade da incidência do ISS sobre a atividade de apostas em geral.
Deste modo, o precedente foi fixado pela constitucionalidade da incidência de ISS sobre os serviços de distribuição e venda de bilhetes e demais produtos de loteria, de bingos, cartões, pules ou cupons de apostas, sorteios e prêmios. Sendo a base de cálculo tributável o valor referente a parcela recebida pela prestação do serviço, isto é, o percentual destinado a remunerar a “casa de aposta” pela atividade.
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