Caso Larissa Manoela – Cuidados e alternativas jurídicas

Caso Larissa Manoela

Muito se tem falado sobre os problemas enfrentados pela atriz e cantora Larissa Manoela, que levou a público os detalhes da relação com os pais, responsáveis pela gestão de sua carreira e de seu patrimônio até o rompimento da relação ocorrido dias atrás.

Larissa despontou na cena artística ainda muito jovem e se consolidou como um dos nomes mais relevantes de sua geração, tendo conquistado precocemente um currículo admirável e, consequentemente, um grande espaço na mídia e ótimos contratos comerciais.

No entanto, apesar de ser ela a geradora da renda e da fortuna da família, Larissa afirma que seus pais nunca lhe prestaram informações sobre a sua situação financeira e patrimonial, e que sequer sabia quanto ganhava. Mais que isso, mesmo após atingir a maioridade, dependia de “mesada dada pelos pais” para custear os seus gastos pessoais, colocando-a em situações no mínimo constrangedoras, como noticiado.

Apesar de muito ter a se falar a respeito do drama vivido pela Larissa, inclusive sob o aspecto moral, focaremos nossa análise nos aspectos jurídicos desta relação e dos cuidados que podem ser tomados.

A estrutura societária utilizada

De pronto, o que chama a atenção é a estrutura societária formatada. Durante quase toda a carreira de Larissa, todos os contratos e grande parte do patrimônio foram concentrados na empresa Dalari Produções e Eventos Ltda., da qual Larissa possui apenas 2% e os pais, os 98% restantes.

Posteriormente, em junho/2020, foi aberta uma empresa de titularidade integral da Larissa, no entanto, sob gestão exclusiva dos pais, que tinham poderes amplos e irrestritos.

Por fim, uma holding foi aberta para concentração do patrimônio familiar, com participações divididas igualmente entre os três, mas pouco chegou a ser utilizada.

O que poderia – ou deveria – ter sido feito?

Há de se pontuar uma particularidade neste caso, uma vez que Larissa passou a gerar renda aos 4 anos de idade e a integrar o quadro de sócios da Dalari quando possuía 13 anos, ou seja, ainda na condição de absolutamente incapaz para os fins da lei e dependente de representação por seus pais para a celebração de todo e qualquer contrato.

Veja que a lei prevê que os menores devem ser representados pelos pais com a finalidade de protegê-los, garantindo que os responsáveis legais estejam efetivamente acompanhando as atividades do menor. Os pais têm o dever não só moral, mas legal de administrar e preservar os bens dos filhos até que eles passem a ter capacidade civil para tanto.

No entanto, pelo que fora evidenciado, os pais da Larissa extrapolaram e muito seus deveres legais ao formatarem estruturas societárias que a deixaram completamente alheia dos assuntos empresariais, financeiros e patrimoniais.

Ainda que os pais exercessem funções de agenciamento e administração da carreira da Larissa, bem como que tenham renunciado às respectivas carreiras para “cuidarem dos interesses da filha”, outros formatos seriam mais adequados e recomendados para preservar todos os interesses e direitos.

É prática de mercado que agentes/administradores de carreiras artísticas recebam remunerações que variam de 10%, 20% ou até 30% dos contratos firmados. No caso em comento, duas estruturas poderiam ser formatadas:

A mais adequada delas seria constituir uma empresa de titularidade exclusiva da Larissa, ainda que representada pelos pais enquanto incapaz, para o desenvolvimento das suas atividades artísticas, recebimento dos direitos personalíssimos, royalties dentre outros. Seus pais desempenhariam suas atividades de agenciamento e administração através de empresa própria, de titularidade apenas destes, e recebimento das partes que lhes coubessem dos contratos firmados pela Larissa através da empresa dela.

Esta prática é bastante comum no mercado e os contratantes estão bastante habituados em segregar os pagamentos, inclusive para fins de evitar a bitributação.

Alternativamente, caso quisessem utilizar um único veículo societário, que então distribuíssem as participações de modo a preservar ao menos 70% para a filha menor.

Para além da estrutura societária para condução das atividades operacionais, a preservação patrimonial deveria estar melhor resguardada. Para isso, deveria ter sido constituída empresa patrimonial exclusivamente em nome da Larissa, na qual seu patrimônio estivesse concentrado, a fim de segregá-lo das atividades operacionais e também do patrimonial de seus pais, de modo que cada parte se aproprie efetivamente do que cabe a cada um, sem abusos ou excessos.

O que ainda pode ser feito?

Larissa já externou sua intenção de abrir mão do patrimônio formado na empresa Dalari, que totaliza algo em torno de R$ 18 milhões, como forma de deixar os pais em situação financeira confortável.

No entanto, se o seu desejo fosse outro, alguns caminhos parecem possíveis, observada a necessária análise de eventual prescrição ou decadência.

Há de se pontuar ainda que os pais sempre exerceram de forma exclusiva a administração das empresas, firmando todos os contratos, realizando todas as movimentações, decidindo sobre critérios de distribuição de lucros, compra e venda de bens e diversas outras decisões de extrema relevância, sem qualquer envolvimento da Larissa e sem a devida prestação de contas, que é uma obrigação legal imposta aos administradores de toda e qualquer sociedade.

Além disso, considerando que a formatação societária foi criada pelos pais e atos de gestão foram por eles praticados quando a Larissa, enquanto sócia da sociedade, era menor de idade, os negócios jurídicos eventualmente praticados em detrimento aos interesses dela podem ser revistos judicialmente, na tentativa de uma recomposição patrimonial.

Lições aprendidas

Infelizmente este não é o primeiro – e provavelmente não será o último – caso envolvendo gestão de carreira, patrimonial e financeira entre familiares que é levado à público. Pelo contrário, é muito mais comum do que se imagina.

Indo além do tema Larissa Manoela, é comum que os pais tenham a tendência de tomar a frente das situações profissionais e patrimoniais do filho ainda inexperiente, buscando oferecer todo o apoio necessário. No entanto, apesar de quase sempre bem-intencionada, esta prática raramente é eficaz, pois é provável que os pais não possuam as competências necessárias para assessor o filho em todas as frentes.

Por fim, é fundamental que os artistas contem com assessoria jurídica especializada para formatação de estruturas societárias e contratuais adequadas à preservação dos seus interesses, ainda – e especialmente – se envolver relação familiar, a fim de evitar complicações como esta que, muito além de gerar problemas jurídicos e financeiros, gera problemas familiares por vezes insuperáveis.

Marco Loureiro, sócio responsável pela área societária do CCLA Advogados

Este informativo tem por finalidade veicular informações jurídicas relevantes aos nossos clientes, não se constituindo em parecer ou aconselhamento jurídico, e não acarretando qualquer responsabilidade a este escritório. É imprescindível que casos concretos sejam objeto de análise específica.

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Marco Loureiro

Atua com direito imobiliário e direito societário desde 2008. Atua também como conselheiro jurídico de startup de entretenimento e tecnologia e como professor convidado de cursos de especialização e pós graduação.
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Marco Loureiro

Atua com direito imobiliário e direito societário desde 2008. Atua também como conselheiro jurídico de startup de entretenimento e tecnologia e como professor convidado de cursos de especialização e pós graduação.